domingo, 29 de junho de 2008

O Escafandro e a Borboleta

Um homem que tinha tudo na vida: fama, mulheres, filhos lindos, um carro conversível e um trabalho glamouroso, sofre um acidente e torna-se completamente paralisado, incluindo sua fala. Tudo de seu corpo que se move é seu olho esquerdo, já que o direito também ficou inutilizado.

Uma história como essa poderia parecer uma das mais tristes e deprimentes da história do cinema. Algo como “Mar Adentro”, em que a imobilidade do protagonista o faz querer desistir da vida e mergulhar na morte. Mas não. Ao contrário do que se possa imaginar, “Escafandro e a Borboleta” é uma ode à vida e à “joie de vivre”.

A narrativa é dividida em duas partes que se entrelaçam: o passado e o presente no hospital. O presente é filmado, em grande parte, do ponto de vista de Jean Dominique Bauby (Mathieu Amalric). Com isso, podemos ver por meio de seus olhos e saber o que ele está sentindo através de sua voz em off, tradutora de seus pensamentos. A outra parte é mostrada um pouco aleatoriamente, seguindo o fluxo de lembranças do protagonista e muitas vezes é enquadrada em planos médios e closes, como que nos aproximando da cena, das emoções vividas ali. Há também espaço para algumas fantasias. Momentos subjetivos em que memória e imaginação se misturam, como a cena de Jean Do e sua atual namorada rolando nas areias de uma praia, como em “A um passo da eternidade” ou a representação dele mesmo, antes do acidente, como Marlon Brando. Há também planos bem estéticos que dão mais sensação, quase física, à cena, como os cabelos esvoaçantes de Marina Hands. E imagens ilustrativas do seu fluxo de pensamentos, muitas vezes servindo como metáforas visuais de seu estado atual.

A direção é espetacular, seja em questão de escolha do elenco, de planos, de diálogos, de trilha sonora, de luz, etc. O resultado final, conjunto de tudo isso, o prova.

A fotografia é genial. As cores muito vivas. Mesmo no hospital, onde tudo é branco ou esverdeado, a luz é bem utilizada, deixando esses tons mais claros, atraentes. O olhar de Jean Do é mimetizado tecnicamente através da constante mudança de foco, pelos closes de todos que se aproximam, ou seja, pela perspectiva a partir de seus olhos aplicada à câmera, pelo vaguear do olhar sempre mudando de direção e, claro, pelas piscadelas, responsáveis por sua nova forma de comunicação.

Os atores estão todos formidáveis. Inclusive os mais secundários como Isaach De Bankolé e Niels Arestrup.

A montagem articula muito bem os dois universos da vida do protagonista, nos dando informações a mais, no tempo certo, e nunca deixando um ou outro saturar.

A narração em off, além de fazer alusão ao livro (muito bem escrito) que vai resultar dessa experiência, se combina perfeitamente com as imagens

A trilha sonora é fantástica. Esta se divide em momentos mais emotivos e suaves, em que estamos em contato com a melancolia da história e outros, mais animados em que fantasia ou lembrança vêm à tona e a música dá a idéia de liberdade e êxtase que tais cenas contêm. Não importa onde e como, ela está sempre lá, ajudando a dar-nos a emoção da cena, a abstrair e a fantasiar junto com o personagem. E também ajudando-nos a voltar à realidade (quase que nos jogando de volta pra ela), quando um corte seco de cena a pára bruscamente. Com direito a Tom Waits e algumas canções pops como “Ultraviolet” de U2 e “Dont’t kiss me goodbye” de Ultra Orange and Emmanuel, até Charles Trénet.

Agora, além de todos os impecáveis fatores técnicos, temos esse homem. Esse novo homem lutando como pode pra escapar de seu escafandro e manter-se uma borboleta. Como Jean Do mesmo diz, ele ainda tem duas coisas que não estão imobilizadas, sua imaginação e sua memória. E se utilizará de ambas para manter-se VIVO, em letra maiúscula.

2 comentários:

Anônimo disse...

O_O
Mas e ai, no final ele volta a se mover? tipo filme da Disney? ou ele se suicida a la filme Cult forçadão?
Ele podia colocar o cerebro em um corpo de macaco robo! Eu assistira a continuação amarradão. Ia ser tipo um hospede do barulho, so q em frances! =O

nairle disse...

Parabéns, vc conseguiu analisar muito bem este filme fastástico! A direcao e maravilhosa, diferente de tudo que já vi. Gostei bastante da trilha sonora. Sabe onde posso encontrar?