domingo, 8 de junho de 2008

Nashville

“Nashville” é um filme fantástico. Segue a famosa tradição do diretor de juntar muitos personagens em pequenas histórias que se relacionam por algum motivo em comum, que normalmente efetiva a união, mesmo que não física, de todos no final do filme. Além de ótimos atores, incluindo alguns menos famosos, mas ainda recorrentes como: Shelley Duval, Henry Gibson e Lily Tomlin, Nashville conta com um ótimo roteiro, cheio de críticas em relação aos EUA.

Lançado em 75, os americanos passavam por um momento difícil: logo depois da guerra do Vietnam, Nixon tinha acabado de sair do governo e eles enfrentavam uma crise de energia. Ótimo momento pra se falar de política. E é exatamente isso que faz o filme, além de passar por outros assuntos, como casamento, estrelato, atentados de assassinato (comuns nessa época), visões estereotipadas e preconceituosas da imprensa, artimanhas políticas, interesse, cultura popular, dentre outros. Tudo isso através da visão tradicional de uma cidadezinha conservadora localizada em Tenessee, EUA.

Uma coisa que gosto muito nos filmes de Altman é que ele nos mostra os fatos e nos apresenta os personagens, ponto. A conclusão, entretanto, vem de nós mesmos. O filme não diz com todas as letras para o que se propõe. Além do que, fala sobre tantas coisas, que seria necessário revê-lo algumas vezes para captarmos todas.

Alguns desses pontos que acharia interessante ressaltar são:

A mídia - A personagem de Geraldine Chaplin é uma repórter britânica que vai aos EUA para investigar o “modo americano de ser”, mas em vez de realmente tentar entender seu entorno, vai atrás do que já pensa conhecer, do que já espera. De certo modo, acho que o filme é exatamente o contrário. É uma investigação real sobre os americanos, sobre o seu modo de viver e de pensar. Não simplesmente uma exposição de estereótipos.

A música - Nesse filme a música utilizada é a country, muito famosa e promovida nos Estados Unidos, principalmente no sul. Vemos personagens comuns e de todas as classes sociais, com hábitos e vidas diferentes que se unem através da mesma. Seja um grupo de cantores gospel, um trio famoso de folk, uma mulher que canta muito mal, mas que devido a seus dotes físicos, consegue vislumbrar seu sonho de ser cantora, uma mulher com talento, mas que devido a não aceitação de seu marido “careta” e de faltas de oportunidade não consegue seguir carreira ou até mesmo uma estrela da música country que canta desde pequena.

Só nesses três personagens Altman já fala sobre o oportunismo, o talentoso que nunca consegue sucesso e alguém que, impulsionada desde criança, trabalha, sem nem mesmo ter tempo de cuidar de si mesma.

A fama - Chegamos então em outro ponto importante do enredo. A vontade, hoje em dia generalizada, mas que surge com força nessa época e nesse local, de ser conhecido, de ter seus cinco minutos de fama. Essa necessidade é muito bem caracterizada não só pelas três personagens mencionadas como por Haven, um famoso cantor de músicas bastante conservadoras que tem o ego muito maior que ele mesmo (certamente) e que julga as pessoas pelo que eles têm a oferecer ou pelo que já alcançaram. Elliot Gould ou Julie Christie, que interpretam a si mesmos, por exemplo, tornam-se importantes figuras e são muito bem tratados por Haven, apesar deste nunca tê-los conhecido, devido aos seus status de “estrelas”. Ainda nessa questão, a validade e a qualidade da arte e dos artistas são questionadas num momento em que fama era tudo e talento ficava em segundo lugar.

O “american way of life” – Tal conceito tão divulgado ao redor do mundo como uma propaganda americana está bastante presente em Nahsville. Muitos de seus personagens perseguem essa promessa e se julgam merecedores de sucesso simplesmente por terem nascido nos EUA, basta querer e se esforçar. Todos querem uma boa família, um bom partido, um bom presidente, um filho com um bom emprego, etc. E se para isso tiverem que passar por cima dos sentimentos dos outros ou dos seus próprios, isso é apenas mera casualidade. Isso tudo parece ser questionado num ato final e excêntrico de um dos personagens.

São muitos atores e muitas histórias. Não é necessário dissertar sobre todas. Apenas digo que vale a pena ver como o diretor consegue com clareza e fluidez conectá-las, perpassando-as por meio de números musicais, num ritmo que dá tempo para cada personagem se estabelecer.
Mais um filme que dá muito valor às expressões, entonações e gestos dos atores, nos aproximando, mesmo que não explicitamente de suas intimidades e emoções e complexificando-os.

Retrata ainda a passividade e a falta de liberdade numa cultura em que se espera que você aja de determinada maneira. Seja o filho de Haven que gostaria de ser cantor, mas vira administrador formado em Harvard, uma cantora sem idéia própria sobre aquilo que faz, mas que segue fazendo, por não saber viver de outra forma ou uma mulher casada infeliz no casamento. Tudo isso de uma maneira muito verdadeira e prazerosa de se ver.

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